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“Todos os anos a minha mulher se queixa que eu nunca lhe faço uma festa surpresa. Este ano vai ser diferente, pelo que estão todos convidados para o almoço de Domingo na minha casa. Eu faço a surpresa e vocês o almoço.”
Eis como, através de um simples SMS que enviei a todos os nossos amigos, começou aquela que foi, de acordo com a minha mulher, o mais surpreendente dia de anos que teve.
Felizmente alguns dos meus amigos levam-me a sério e resolveram fazer mesmo o almoço (passaram imediatamente para a categoria de melhores amigos, destronando outros, que pensam que estou sempre na brincadeira). A coisa ficou combinada da seguinte forma: eu, supostamente, iria levá-la a comer fora, apenas com mais duas amigas, e entretanto algo iria acontecer que nos obrigaria a voltar para casa e aí…Pumba!!! Surpresa!!!
- E o que é que vais inventar para te obrigar a voltar para casa? – pergunta-me uma das que estava na categoria de melhor amiga.
- Não te preocupes com isso! Pelo menos vê se fazes a porra de um doce, para não me apareceres aqui de mãos a abanar. – respondo, deixando-a amuada.
Foi aí que me surgiu a ideia! Se eu conseguir que a minha mulher amue vai querer voltar rapidamente para casa. Mas depois pensei melhor e cheguei à conclusão que as mulheres, quando amuam, ficam com uma certa tendência para a violência, pelo que após ter ido trocar de roupa, devido ao banho de chá que a minha antiga amiga me enviou para cima, pensei que o melhor seria inventar outra coisa.
Chega então o dia. A sua disposição não podia ser melhor:
- Então vamos à Vidigueira, a um dos restaurantes mais caros da região, e nós é que pagamos? Por que razão não podemos dividir a conta com as nossas amigas? Elas não se importam? – dizia ela, meio irritada por já serem horas de almoço e eu ainda não lhe ter dado qualquer presente.
- Deixa de ser sovina, esse é o meu papel! – digo, com a minha habitual sinceridade.
- E porque é que não comemos aqui em casa? Elas vêm cá ter e eu faço o almoço.
- No teu dia de anos? Fazeres o almoço? Nem pensar. O que raio é que tu pensas que é a tua prenda? Este almoço vai-me custar os olhos da cara.
Bom, depois disto tive algumas dificuldades em tirá-la de casa, mas lá a convenci que a reserva que fiz no restaurante implicou o pagamento de um significativo sinal.
Chegados à Vidigueira, tive que fingir que não fazia ideia onde ficava o restaurante, de forma a ter tempo para que os nossos melhores amigos, e os outros, chegassem à nossa casa e preparassem tudo. Quando estávamos “perdidos” algures numa praça, toca o meu telemóvel. Era a deixa para voltarmos.
- O quê? Teve um princípio de enfarte? Mas…. – dizia eu, já depois de, do outro lado, terem desligado – Estão à porta da nossa casa? E ela, como está?........Ui…..Não se preocupem, vamos já para aí. Pede as chaves da nossa casa à nossa vizinha e entra com ela. Deita-a numa cama para ver se melhora. Nós vamos já para aí!
Confesso que quando desliguei o telefone e olhei para a minha mulher, pensei que ela tivesse desconfiado que havia ali uma marosca, tal era o brilho nos seus olhos. Autocritiquei-me pelo meu excessivo exagero.
- Mas….a Graça?? Outra vez?? Mas…?? – dizia ela, com aflição e quase a chorar.
Suspirei de alívio (muito discretamente, claro).
- Pois… Sentiu-se mal quando estavam a caminho e, por sorte, estavam a passar perto da nossa casa. – disse-lhe, com um ar muito preocupado – Vamos depressa! Provavelmente teremos que chamar o INEM!
Entrámos no carro e voltámos rapidamente para casa. Pelo caminho, enquanto ela soluçava, não consegui evitar uns pequenos risos (que disfarçava como podia, ou seja, como se também estivesse a chorar de preocupação) pensando na surpresa que ela iria ter.
Mal chegámos, ela saiu (quase com o carro em andamento) e entrou em casa a gritar pela sua amiga. E foi aí que todos apareceram a cantar-lhe os parabéns.
Quando a conseguimos reanimar (com algum esforço, diga-se de passagem) chamou-me a um canto e deixou bem claro que nunca mais iria querer festas surpresas no seu aniversário.
Mas ela ainda não sabia que mais surpresas vinham a caminho…..
Depois do excelente almoço feito pelo, agora, nosso melhor amigo. Pedi a palavra.
- Meus amigos – disse para o geral - …e conhecidos – disse, dirigindo-me especificamente para quem (há uns dias) me tinha dado um banho de chá – Quero agradecer a vossa presença nesta festa, a qual serve para mostrar que as rugas na cara da minha mulher são o resultado directo da sua idade, e que os cremes pouco ou nada podem fazer, relativamente a isso. – é sempre bom começar um discurso com uma piadola (à qual, só o meu novo melhor amigo se riu).
Depois de mais uma série de considerações sobre o que era viver com uma mulher que se aproximava, de uma forma galopante, da menopausa (sentindo sempre o apoio incontestável do meu novo melhor amigo) achei que estava na altura de puxar ao sentimentalismo.
- Para terminar, quero dizer que me encontro casado com a mulher da minha vida, a qual já admitiu por várias vezes que é uma grande chata, e que isso é a causa de muitas das nossas discussões. Pelo que agora também quero eu admitir algo, perante todos vós. Quero te dizer, meu amor – disse, enquanto olhava para os seus lindos olhos e lhe segurava na mão – que tudo isto que fiz por ti hoje, e tudo o que acabei de dizer, provam o quanto gosto de ti e o que estou disposto a fazer para te ver feliz. E também tudo isto - e aqui tive que fazer uma pausa emocional - custou muito menos do que aquele frasco de perfume, que tu querias que eu te oferecesse como prenda.
A forma como os seus olhos voltaram a brilhar e o aperto esmagador que senti na minha mão, serviram para mim, como um claro reconhecimento de todo o amor que, ali naquele momento, ela sentia por mim.